27/06/2011

Má Vontade

... Escrevo essa carta, pois de outra forma eu não conseguiria dizer o que tenho pra ser dito. A má vontade e a desconfiança, natural que temos do outro impede a comunicação aberta e sem ruídos.

Espero que esse texto seja claro e traga conciliação. Desejo que ele fale ao coração que aceita tudo com bondade. O escrevo simples para que a verdade por trás dele se mostre com mais facilidade.

Acredito que, antes de qualquer coisa, é necessário estar aberto ao outro. Sem isso é impossível o diálogo (principio político de convivência) e sem o diálogo é impossível compreender, respeitar ou aceitar o novo.

Esse estado negativo de viver (desconfiado de tudo) é bom para o ego, pois ele nos afirma e nos coloca em condição de autonomia, mas é ruim para o espírito. Fechamos-nos para a curiosidade natural que sentimos de conhecer o mundo, de associar novas idéias às nossas, de propor, a partir de nossa habilidade, inovações encima dos conhecimentos que muitas vezes não aceitamos.

O mal estar é compreensivo numa sociedade que prega a vantagem individual em prol do coletivo. O próprio sistema, corrompido por esse ideal de desconfiança nos ensina a procurar brechas jurídicas para nossa própria vantagem, os advogados e tribunais estão preparados para a separação (litígio), sendo que a propensão natural do ser humano seria a conciliação, o acordo. Perdemos muito com isso, pois levamos esse mal estar que vemos na grande sociedade para o interior da pequena sociedade, repetimos esse padrão de má vontade com nossos amigos, colegas de estudo e até com nossa família.

A má vontade impede a ampliação da mente, nos fecha ao novo, ao outro e a nos mesmos. Acreditamos que estamos seguros indo contra todos, mas na verdade nos afastamos da nossa própria essência de nosso pleno potencial. A má vontade impede o conhecimento (que é a ação de se envolver com o que se aprende) e nos torna alheios ao mundo.

Bem ao contrário, somos seres coletivos e racionais e nesse caso a racionalidade está a serviço da coletividade e não na defesa do ego, a razão é necessária para o dialogo, para aceitação, para tolerância, para a busca do consenso, abrir-se ao outro é primeiro passo para chegar à nossa essência.

Para que essa convivência seja efetiva é necessário amar de boa vontade, estar aberto, para nos afirmarmos enquanto indivíduos plenos. Simples assim. Para se viver uma vida plena é necessário ter boa vontade. É necessária boa vontade, mas a vida plena não se resume só a essa ação. É necessário consciência para formação de nossa maturidade, para adquirir paz de espírito e compreensão das nossas limitações. É necessário ajuda divina para orientação das nossas potencialidades. É necessário altruísmo e humildade para nos compreendemos como parte de um todo. É necessário ser humano.

Pensando nessa determinação que devemos ter para nos tornarmos completos lembro-me de um programa que eu vi dias atrás sobre a vida de Sócrates, mais especificamente sobre a ‘Apologia’. O programa reconta o final da vida do Ateniense. Sócrates está no cárcere afirmando o amor pela verdade. Em discussão estão os conceitos sobre justiça e verdade. Em paralelo ao conto de Platão, é apresentado conceitos de julgamento e exemplos de julgados, situações de personagens reais que, assim como Sócrates, tiveram que se defender contra todos, em busca de um ideal.

Na história Sócrates foi julgado por corromper a juventude e por proferir a crença a falsos deuses, mas essas não foram as reais acusações que tinham contra ele. A verdade é que o acusavam de ser um incomodo nos lugares públicos, Sócrates vivia nas praças questionando livremente em busca da razão das coisas, atormentando figuras publicas e desnudando a verdade na frente de todos.

Conta que os atenienses, na verdade, queriam que Sócrates saísse da cidade, que renunciasse ao direito de ser cidadão e não voltasse mais, o pensador se faz rebelde de um tempo e negando o exílio, toma um cálice de cicuta em honra aos seus ideais.

O tempo passou e reflito como seria se Sócrates aparecesse agora, penso que o passado não mudaria e ele morreria com um tiro fácil-fácil. Uma coisa fica da história de Sócrates, ele não conseguiu despertar todos com quem conversou, só conseguiu isso com quem se dispôs a escutá-lo, a dialogar. Só se despertou quem teve boa vontade para tal atitude.